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Ismael, ou o homem a quem na maior parte do tempo, não por acaso, devemos chamar Ismael, não teve uma infância fácil. Ainda assim, conseguiu superar obstáculos, estudar, tornar se professor de línguas e literatura, e instalar se, mesmo que sem grande estrondo, numa existência rotineira e pacata. Isto até ao dia em que lhe cai um botão da camisa e reencontra uma antiga vizinha, aproximando se da felicidade. Isto até ao dia em que vai comprar pão e, pelo caminho, aceita boleia de um antigo aluno. Isto até ao dia em que acorda confuso e atordoado num hospital, recordando apenas com clareza os livros que leu. Depois desse dia, nada voltará a ser igual, com a destreza narrativa de Jaume Cabré a conduzir nos irresistivelmente por um labirinto de memórias difusas, dilemas, personagens complexas, amores impossíveis, destinos implacáveis, falenas e javalis.

Excertos
«A presença das falenas nunca diminui, louvado seja Deus, de onde sairão tantas falenas atraídas pela luz? Pois bem, na história que vos quero contar, pensava ser meu o papel da osga (pacífica e terna), mas acabei por ser uma borboleta nocturna cinzenta deslumbrada pela claridade, uma borboleta alheia aos perigos inerentes à proximidade dos candeeiros e à terrível e mortífera eficácia da luz projectada nem que seja pela chama de uma simples vela. Esta é a minha história, sim. Além de ser a história de mais alguns, sim. Ah, e chamem-me Ismael. Sim, sim, Ismael: leram bem.»