Particular
Descrição
CRUZEIRO SEIXAS
Homem cavalo
Escultura em gesso, banhada de pintura castanha, original.
Assinada e datada 98 na base
Alt: 31 cm
Nota: Número de tiragem não vísivel, mas provavelmente de uma tiragem
de 7 exemplares.
Também assinada na base pela amiga do Cruzeiro Seixas, Isabel Meyrelles.
Nascida em Matosinhos, Isabel realizou os estudos no Porto com o escultor Américo Gomes. O seu pai era um dos sócios gerentes de uma empresa com implicações coloniais em plantações de açúcar (a Refinaria Angola em Matosinhos, pertencente à Companhia do Açúcar de Angola), mas Isabel refere sobretudo a importância de uma infância passada com a avó e a tia na aldeia de Sendim na Beira Alta [2]. Em 1949, mudou-se para Lisboa, com estúdio na Rua do Ferragial (perto da Escola das Belas Artes), para estudar com o escultor António Duarte. Foi amiga dos artistas e poetas Mário Cesariny e Cruzeiro Seixas, membros do grupo dissidente Os Surrealistas, apesar da misoginia dos outros elementos deste grupo. Juntos alugavam uma casa ao pescador Manuel Moscardo na Costa da Caparica, que ainda era uma zona deserta, onde Isabel praticava nudismo e se juntava aos rituais ocultistas improvisados pelo grupo junto da arriba, na Descida das Vacas[3] [4]. Conhecida pelos amigos como Fritzi, Isabel causava escândalo ao fumar cachimbo no café Palladium e foi detida várias vezes por parecer "um homem vestido de mulher" [5]. « Há muito pouca normalidade no que eu faço. Nunca pensei que estava a fazer parte do grupo surrealista, eu era uma mulher diferente das outras. Eles pareciam gatos assustados quando me viam, para eles eu era um bicho assustador: ‘isto é uma mulher?!’ », evoca Isabel em 2023[6]. Este pesado contexto social da ditadura levou-a a mudar-se para Paris em 1950, onde estudou escultura na Escola Nacional Superior de Belas Artes e uma análise comparada da poesia medieval francesa e portuguesa na Universidade Paris-Sorbonne.[7] Na sua casa da rua de Savoie recebia os amigos portugueses, incluindo Mário Cesariny em 1964, onde este escreveu A Cidade Queimada (até passar dois meses na prisão de Fresnes, devido a ter sido surpreendido em acto sexual numa sala de cinema [8]). O escritor Alfredo Margarido viveria em sua casa durante o período em que Isabel regressará a Lisboa.
Cruzeiro Seixas frequentou a Escola António Arroio, onde fez amizade com Mário Cesariny, Marcelino Vespeira, Júlio Pomar e Fernando Azevedo.[5]
Em meados da década de 1940 aproxima-se do neorrealismo, de que se afasta quando adere aos princípios do surrealismo. Juntamente com Mário Cesariny, António Maria Lisboa, Carlos Calvet, Pedro Oom e Mário-Henrique Leiria, entre outros, integra o grupo Grupo Surrealista de Lisboa, resultante da cisão do recém formado movimento surrealista português. Participa na exposição desse grupo em 1949 (1ª exposição dos Surrealistas, Lisboa).[5]
Em 1950 alista-se na Marinha Mercante e viaja até África, Índia e Ásia. Em 1951 fixa-se em Angola, desenvolvendo atividade no Museu de Luanda. Data desse tempo o início da sua produção poética.[6] Realiza as primeiras exposições individuais, que levantam um acalorado movimento de opinião (a primeira de desenhos sobre a evocação de Aimé Cesaire, em 1953; a segunda principalmente de «objectos» e «colagens», 1957).[7]
Regressa a Portugal em 1964. Em 1966 é convidado por Natália Correia a ilustrar a célebre obra Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica.[8]
Recebe uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian em 1967. Nesse mesmo ano realiza uma pequena retrospetiva na Galeria Buchholz (com folha volante de Pedro Oom e prefácio de Rui Mário Gonçalves) e expõe na Galeria Divulgação, Porto. Em 1970 expõe individualmente na Galeria de S. Mamede, Lisboa, um conjunto de desenhos "de uma imagética cruel, ilustrações possíveis de Lautréamont".[9] [5]
Trabalha como programador nas Galerias 111 e São Mamede, Lisboa. Viaja pela Europa; entra em contacto com membros do surrealismo internacional. Radica-se no Algarve na década de 1980, trabalhando como programador de diversas galerias. Colabora em revistas internacionais ligadas ao surrealismo, a que sempre se manteve fiel.[5] Apesar de ter vendido muitas obras antes do 25 de Abril, Cruzeiro Seixas foi literalmente espoliado por um dos seus secretários, que se apoderou de grande parte dos seus quadros e do produto das vendas. O pintor relata que o outro lhe dizia: “Ó Cruzeiro Seixas, hoje foi um dia formidável, consegui fazer tanto dinheiro que comprei uma casa para mim no Algarve e comprei um carro em segunda mão para si.”[10]
O traço certeiro de Cruzeiro Seixas, "de limites apurados e atmosferas de vertigem […] edifica um mundo desolador em que a face onírica e literária não esconde a violência do conjunto, destruindo toda a possibilidade de quietude". Mas essa noite primordial e inquietante "soube coexistir com paisagens mais ligeiras e felizes, como algumas das pintadas nos anos de Angola, e com citações plásticas da história da arte, num jogo de grande prazer plástico, bem como com objetos dotados de flagrante poética, na sua simplicidade de materiais, de técnicas e no sobressalto imaginativo".[5]
A 8 de junho de 2009, foi agraciado com o grau de Grande-Oficial da Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, do Mérito Científico, Literário e Artístico.[11]
Em 2012, mudou-se de Lisboa para Vila Nova de Famalicão, para estar perto do seu espólio, guardado no Centro de Estudos do Surrealismo da Fundação Cupertino de Miranda,[12] Fundação essa que o apoiou financeiramente até ao final dos seus dias. No entanto, devido ao isolamento em que se sentia, decidiu regressar a Lisboa, onde viveu os últimos tempos da sua vida na Casa do Artista.[13] Na velhice, sofreu de degenerescência macular, o que o impedia de ler e de trabalhar.
Morreu a 8 de novembro de 2020 no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
Homem cavalo
Escultura em gesso, banhada de pintura castanha, original.
Assinada e datada 98 na base
Alt: 31 cm
Nota: Número de tiragem não vísivel, mas provavelmente de uma tiragem
de 7 exemplares.
Também assinada na base pela amiga do Cruzeiro Seixas, Isabel Meyrelles.
Nascida em Matosinhos, Isabel realizou os estudos no Porto com o escultor Américo Gomes. O seu pai era um dos sócios gerentes de uma empresa com implicações coloniais em plantações de açúcar (a Refinaria Angola em Matosinhos, pertencente à Companhia do Açúcar de Angola), mas Isabel refere sobretudo a importância de uma infância passada com a avó e a tia na aldeia de Sendim na Beira Alta [2]. Em 1949, mudou-se para Lisboa, com estúdio na Rua do Ferragial (perto da Escola das Belas Artes), para estudar com o escultor António Duarte. Foi amiga dos artistas e poetas Mário Cesariny e Cruzeiro Seixas, membros do grupo dissidente Os Surrealistas, apesar da misoginia dos outros elementos deste grupo. Juntos alugavam uma casa ao pescador Manuel Moscardo na Costa da Caparica, que ainda era uma zona deserta, onde Isabel praticava nudismo e se juntava aos rituais ocultistas improvisados pelo grupo junto da arriba, na Descida das Vacas[3] [4]. Conhecida pelos amigos como Fritzi, Isabel causava escândalo ao fumar cachimbo no café Palladium e foi detida várias vezes por parecer "um homem vestido de mulher" [5]. « Há muito pouca normalidade no que eu faço. Nunca pensei que estava a fazer parte do grupo surrealista, eu era uma mulher diferente das outras. Eles pareciam gatos assustados quando me viam, para eles eu era um bicho assustador: ‘isto é uma mulher?!’ », evoca Isabel em 2023[6]. Este pesado contexto social da ditadura levou-a a mudar-se para Paris em 1950, onde estudou escultura na Escola Nacional Superior de Belas Artes e uma análise comparada da poesia medieval francesa e portuguesa na Universidade Paris-Sorbonne.[7] Na sua casa da rua de Savoie recebia os amigos portugueses, incluindo Mário Cesariny em 1964, onde este escreveu A Cidade Queimada (até passar dois meses na prisão de Fresnes, devido a ter sido surpreendido em acto sexual numa sala de cinema [8]). O escritor Alfredo Margarido viveria em sua casa durante o período em que Isabel regressará a Lisboa.
Cruzeiro Seixas frequentou a Escola António Arroio, onde fez amizade com Mário Cesariny, Marcelino Vespeira, Júlio Pomar e Fernando Azevedo.[5]
Em meados da década de 1940 aproxima-se do neorrealismo, de que se afasta quando adere aos princípios do surrealismo. Juntamente com Mário Cesariny, António Maria Lisboa, Carlos Calvet, Pedro Oom e Mário-Henrique Leiria, entre outros, integra o grupo Grupo Surrealista de Lisboa, resultante da cisão do recém formado movimento surrealista português. Participa na exposição desse grupo em 1949 (1ª exposição dos Surrealistas, Lisboa).[5]
Em 1950 alista-se na Marinha Mercante e viaja até África, Índia e Ásia. Em 1951 fixa-se em Angola, desenvolvendo atividade no Museu de Luanda. Data desse tempo o início da sua produção poética.[6] Realiza as primeiras exposições individuais, que levantam um acalorado movimento de opinião (a primeira de desenhos sobre a evocação de Aimé Cesaire, em 1953; a segunda principalmente de «objectos» e «colagens», 1957).[7]
Regressa a Portugal em 1964. Em 1966 é convidado por Natália Correia a ilustrar a célebre obra Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica.[8]
Recebe uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian em 1967. Nesse mesmo ano realiza uma pequena retrospetiva na Galeria Buchholz (com folha volante de Pedro Oom e prefácio de Rui Mário Gonçalves) e expõe na Galeria Divulgação, Porto. Em 1970 expõe individualmente na Galeria de S. Mamede, Lisboa, um conjunto de desenhos "de uma imagética cruel, ilustrações possíveis de Lautréamont".[9] [5]
Trabalha como programador nas Galerias 111 e São Mamede, Lisboa. Viaja pela Europa; entra em contacto com membros do surrealismo internacional. Radica-se no Algarve na década de 1980, trabalhando como programador de diversas galerias. Colabora em revistas internacionais ligadas ao surrealismo, a que sempre se manteve fiel.[5] Apesar de ter vendido muitas obras antes do 25 de Abril, Cruzeiro Seixas foi literalmente espoliado por um dos seus secretários, que se apoderou de grande parte dos seus quadros e do produto das vendas. O pintor relata que o outro lhe dizia: “Ó Cruzeiro Seixas, hoje foi um dia formidável, consegui fazer tanto dinheiro que comprei uma casa para mim no Algarve e comprei um carro em segunda mão para si.”[10]
O traço certeiro de Cruzeiro Seixas, "de limites apurados e atmosferas de vertigem […] edifica um mundo desolador em que a face onírica e literária não esconde a violência do conjunto, destruindo toda a possibilidade de quietude". Mas essa noite primordial e inquietante "soube coexistir com paisagens mais ligeiras e felizes, como algumas das pintadas nos anos de Angola, e com citações plásticas da história da arte, num jogo de grande prazer plástico, bem como com objetos dotados de flagrante poética, na sua simplicidade de materiais, de técnicas e no sobressalto imaginativo".[5]
A 8 de junho de 2009, foi agraciado com o grau de Grande-Oficial da Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, do Mérito Científico, Literário e Artístico.[11]
Em 2012, mudou-se de Lisboa para Vila Nova de Famalicão, para estar perto do seu espólio, guardado no Centro de Estudos do Surrealismo da Fundação Cupertino de Miranda,[12] Fundação essa que o apoiou financeiramente até ao final dos seus dias. No entanto, devido ao isolamento em que se sentia, decidiu regressar a Lisboa, onde viveu os últimos tempos da sua vida na Casa do Artista.[13] Na velhice, sofreu de degenerescência macular, o que o impedia de ler e de trabalhar.
Morreu a 8 de novembro de 2020 no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
ID: 660700163
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Publicado 02 de dezembro de 2025
Escultura HOMEM CAVALO de Cruzeiro Seixas e Isabel Meyrelles
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